Quando se fala em tecnologia, inovação e futuro, o Web Summit é um dos primeiros nomes que aparecem. Milhares de pessoas, centenas de palcos, marcas globais e oportunidades que podem mudar carreiras. No meio desse universo, este ano, estava um jovem cabo-verdiano que conhece de perto o que é crescer com poucas oportunidades: Djey, do bairro de Lem Cachorro, na Praia.
Convidado pela Cabo Verde Digital para participar no Web Summit como influencer e repórter, Djey levou consigo não só a sua criatividade, mas também a realidade de muitos jovens que, tal como ele, nasceram em contextos de vulnerabilidade e lutam para encontrar o seu espaço.
Quem é o Djey?
“Sou um rapaz que nasceu numa barraca, no meio da pobreza, no bairro de Lem Cachorro”, conta. A infância foi marcada por dificuldades, uma família desestruturada e um ambiente onde quase ninguém acreditava no seu potencial. Muitos dos amigos acabaram por seguir caminhos complicados. Ele decidiu romper esse ciclo.
Em vez de reproduzir a realidade dura à sua volta, transformou-a em combustível. A dor virou força. As limitações do bairro tornaram-se foco. A falta de oportunidades levou-o a criar as suas próprias. Aos poucos, com um telemóvel, criatividade e consistência, começou a construir um caminho nas redes sociais.
Hoje, cada passo que dá é, nas palavras dele, uma prova de que “não é de onde vens que te define, mas a coragem que tens para não desistir”.
Do Lem Cachorro ao Web Summit
O convite para o Web Summit não foi sorte. Foi consequência.
A Cabo Verde Digital vinha a acompanhar o crescimento de Djey como criador de conteúdo e percebeu o impacto real do seu trabalho, especialmente através dos vídeos com crianças - conteúdos leves, genuínos e com grande alcance, que criaram uma ligação forte com o público cabo-verdiano dentro e fora do país.
Embora venha de um bairro humilde, o público de Djey nunca esteve limitado a esse espaço. Os seus vídeos atravessaram fronteiras, chegaram a várias ilhas, à diáspora e a pessoas de diferentes idades. Essa capacidade de comunicar de forma simples, criar empatia e representar o dia a dia cabo-verdiano fez com que a Cabo Verde Digital visse nele alguém capaz de representar Cabo Verde num dos maiores eventos tecnológicos do mundo.
No Web Summit, Djey esteve como influencer e repórter, a acompanhar o ambiente do evento, a partilhar conteúdos para o público cabo-verdiano e a mostrar que também há espaço para jovens de bairros periféricos nos grandes palcos da inovação global.
Quando o trabalho começou a ultrapassar fronteiras
O momento em que Djey percebeu que o seu trabalho podia ir “além das fronteiras de Cabo Verde” não aconteceu num estúdio nem num evento oficial. Aconteceu no telemóvel.
Começaram a chegar mensagens de jovens da diáspora, pessoas que nunca o tinham visto pessoalmente, mas que se reviam na forma simples e verdadeira com que ele cria conteúdo. Muitos falavam de saudade de Cabo Verde, de infância, de família. Os vídeos com crianças, em especial, ganharam uma força inesperada e chegaram a Portugal, Brasil, Estados Unidos e a várias comunidades cabo-verdianas espalhadas pelo mundo.
Foi nesse contacto direto com o público que ele percebeu: o que faz no bairro já não pertence só ao bairro. Ganhou mundo.
Representar Cabo Verde num palco global
Estar no Web Summit foi, para Djey, uma mistura de responsabilidade e confirmação. Responsabilidade por saber que carregava a bandeira de Cabo Verde num evento global. Confirmação de que o caminho que escolheu - o da criatividade, da consistência e da autenticidade - é válido, mesmo quando começa num contexto onde quase tudo parece dizer o contrário.
Ao circular entre startups, investidores, criadores e líderes de tecnologia, Djey mostrou outro tipo de inovação: a capacidade de transformar uma história de vulnerabilidade numa narrativa de inspiração.
A mensagem de Djey para os jovens de Cabo Verde
No fim, a história de Djey não é só sobre o Web Summit. É sobre o que ele representa para quem está, hoje, em bairros semelhantes ao Lem Cachorro e sente que o futuro é curto.
“Quero que os jovens saibam que o lugar onde nasces não decide o teu futuro. Eu nasci numa barraca, mas isso nunca me impediu de sonhar grande. A tua realidade pode ser difícil, mas não tem de ser o teu limite.”
Acreditar em si mesmo, trabalhar com foco e não aceitar que a opinião dos outros dite até onde se pode chegar.
“Se fores consistente, consegues ir muito mais longe do que imaginas.”
Do Lem Cachorro para um dos maiores palcos da tecnologia mundial, Djey mostra que quando o talento se junta à coragem e à consistência, até os limites do bairro deixam de ser fronteiras. São apenas o ponto de partida.